Se eu pudesse ler apenas 10 livros pelo resto da minha vida, Pachinko seria um deles. É um calhamaço de 528 páginas que à primeira vista, você pensa "Será que vou conseguir ler esse livro enorme?", mas que depois, você se envolve tanto com a história que nem quer mais que ela termine.
Eu sou descendente de japoneses por parte de pai e mãe, mas por parte de pai, para simplificar, é como se eu fizesse parte de uma minoria étnica. Mesmo se tivesse nascido no Japão, sofreria algum tipo de preconceito por isso, pois fenotipicamente falando, tenho traços característicos que sempre me fizeram sentir que não era "japonesa o bastante", mas hoje tenho orgulho disso.
"Tá, mas por que isso é importante?" Bem, Pachinko fala sobre o domínio japonês na Coréia, imigração coreana no Japão e digamos que essa minoria étnica da qual faço parte sofreu isso por parte do Japão e foi perseguida de formas muito semelhantes aos coreanos. Então isso me atingiu de forma MUITO pessoal.
A protagonista, Sunja, é acompanhada ao longo da sua vida, até mesmo antes do seu nascimento, mostrando o tenso domínio japonês na Coreia (a Coreia foi anexada ao Japão de 1910 a 1945), a perda precoce de seu pai, seu casamento e consequente imigração ao Japão, onde não sabia falar a língua e não tinha ninguém além de seu marido e seus cunhados.
Sunja engravida de um homem pelo qual se apaixonou, Koh Hansu, que, após anunciar a gravidez a ele, descobre que é casado e se recusa a ser sustentada por ele como sua amante, que além de tudo, faz parte da máfia japonesa. Logo após, ela se casa com outro homem, o qual estava ciente de que ela estava grávida de outro homem e estava prestes a ir morar no Japão com seu irmão.
Sunja e sua família passam a Segunda Guerra Mundial no Japão e este período é retratado de uma forma que eu mesma nunca havia parado para pensar, sobretudo porque no colégio, pouco vemos sobre o Japão além das bombas de Hiroshima e Nagasaki.
Com o passar dos anos, as duas gerações seguintes passam a dominar mais os capítulos, mas nunca sem ressaltar que apesar de terem nascido no Japão, sequer eram cidadãos japoneses - literalmente. Infelizmente, ainda nos dias de hoje é muito difícil conseguir a cidadania no Japão quando se é filho de estrangeiros, mesmo nascendo em terras japonesas.
Um salão de Pachinko.
Pachinko é uma espécie de cassino com cara de pinball, uma casa de jogos de azar extremamente popular no Japão. De início, ele não aparece na história, mas após um tempo, ele aparece e dá para entender o porquê do título.
O livro aborda tantos pontos, alguns que eu nem esperava que fossem citados e em alguns momentos, cheguei a pensar "Como assim a autora conseguiu descrever tão bem a vida nessa época?", porque parecia até um relato da época.
A autora, Min Jin Lee, nasceu em Seul, na Coreia, mas se mudou para os EUA aos 7 anos, morou no Japão por 4 anos e suas experiências como imigrante foram uma grande fonte de inspiração para o livro, além de várias entrevistas com imigrantes coreanas no Japão.
Pachinko fala muito sobre xenofobia, sobre não-pertencimento (posso dizer que como neta/bisneta de imigrantes, não me sinto 100% brasileira e muito menos 100% japonesa e é o mesmo para eles nessa relação Coreia/Japão) e a tentativa de se encaixar em um país estrangeiro. O Japão fez coisas terríveis aos coreanos e até hoje não se retratou como deveria. É um passado vergonhoso e que deve sempre ser relembrado.
E fica a dica: não, asiático não é tudo igual e inclusive há vários conflitos entre eles! Pachinko é uma grande aula de história sobre Coreia e Japão, sobre suas culturas e, sobretudo, a vida e seus altos e baixos.
O livro está sendo adaptado pela Apple TV+ (com Youn Yuh-jung, primeira da direita para a esquerda, ganhadora do Oscar por Minari, como a Sunja de 1989) com a primeira temporada já lançada e foi renovada para uma segunda, mas atenção: o livro tem a passagem de tempo de forma linear, diferentemente da série, onde você já de cara conhece o neto de Sunja, Solomon, um jovem adulto no ano de 1989, intercalando com uma jovem Sunja. Também há mudanças consideráveis em alguns detalhes da história, mas nada que prejudique a experiência - recomendo para quem quer ter mais noção sobre a história antes de ler!
Título: Pachinko
Autoria: Min Jin Lee
Gênero: Ficção Histórica
Páginas: 528
Nota: 5,0/5,0 ⭐
Adoro ler o que as pessoas escrevem porque é como dar uns passinhos na mente de outra pessoa por alguns minutos. <3 Parabéns pelo texto, sei que esse livro foi muito importante pra você!
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